Morrem no peito Legiões

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No ciclo eterno das estações, em cada nova reunião
A percepção exacta da palavra, do gesto
Como prolongamento, como extensão da âncora

Fundeada no longínquo mar dos meus ancestrais.

Uma nítida dimensão onde adormecem os sentidos
A claridade dos dias, a luminosidade das noites
Confinadas aos cantos desta dor

Em demorados rituais, em prolongadas penitências.
À luz de outras existências, noutras sangrentas arenas
Tolhidos movimentos, envoltos, por lúgubre manto
Qual pesada lacerna    

Na demanda que cruza este avito tempo 
Desfaço a alma, contorço o corpo
Esfolo dos pés a pele, em passos sem cáliga.
Percorro o vazio da antecâmara até à boca

Revela-se agora um acústico círculo de vozes em coro
Onde se faz murmúrio e do murmúrio a palavra
E da palavra o cântico, rasgado por gritos   

A plena evocação, à alma de todos os corpos
À loucura dos massacres

Ao delírio de todas as dores, num único momento.

3 comentários:

maria joão moreira disse...

muito, muito bom! gostei de ler, tive de reler para tentar perceber, acho que percebi, ficou.

Filipe Campos Melo disse...

O tempo em retorno é elíptico
Uma circunscrita redoma
Um espaço ritual

(a percepção?)

Dos vultos em envolto movimento
Em tolhidas demandas

(passos?)

No circulo que se forma
disformes formas
gritos
quase palavras

(evocações poéticas da dor?)

(...)

No peito nascem (sincopados) os versos que o desfazem
como legiões


Sempre bom te ler

Abraço

Suzete Brainer disse...

"No ciclo eterno das estações,em
cada nova reunião
A percepção exata da palavra,
do gosto
Como prologamento,como extensão
da âncora"
Sim, trazemos no peito as dores nossas,repletas de histórias anteriores(eco de vozes em coro),mas a palavra como navalha,que evoca e denuncia os registros dos velhos e novos sentires...
Amigo,sempre bela e profunda a tua poesia!
Bj.