E Eu, dividido e disperso no tempo.
Dia por dias, passados e futuros, que me imprimem fotocópia.
Imagino-me na totalidade, repartido por folhas diversas
Respeito instruções, a vida fora do corpo, de uma gráfica universal
Sigo à risca e metodicamente o manual do sapiens republicado
Onde à nascença foi carimbado o meu nome.
…
Para amanhã, já me dei à luz
Alimentei-me de rotina para morrer ao fim do dia
Mas hoje, sem a asma que sei que sentirei amanhã pela manhã
Sem o ar de frete que me trazem outros na cara na fila do trânsito
Sem trabalho, sem almoço, sem cigarros, sem mais trabalho a
tarde toda
Sem o embrulho no estômago… jindungo no cu de todos os meus eus
Sem luzes agarradas aos faróis na fila de volta a casa
Sem banho, sem jantar, sem bola na TV, sem cama e sem sono
Hoje, sem nada do que me fará ser eu amanhã.
Delírio passado ou verborreia inútil
Nasci em partos complicados e criei-me igual todos os dias
E nem num apenas, me mandei a merda e fiquei a dormir.
Noites, insónias suadas
E guilhotinas suaves para encadernar vida em pensamentos.
Lição futura ou cáustica previsibilidade.
Crio-me de novo, cómodo, e de novo e para o ano inteiro
Amamento-me e cresço nos lençóis surrados da preguiça de os
mudar hoje
…
E eu, tantos
Já sou tantos, antes e depois, que agora, não sei qual sou
realmente
Que importa, sou todos, uns iguais aos outros
E de todos, não quero ser nenhum de mim
Convoquei-os, mesmo àqueles que já esqueci
Reunião, assembleia-geral, eu com os meus eus reunidos à minha
volta
Todos intimados a escrever sobre quem sou.
O tempo não existe
E eu, momento, folhas brancas.
Folhas brancas
Ou uma vida inteira.
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