Não deixes
Que te convença
Não te demovas
Por mim
Ou por alguém
Finca os pés na terra plana com aquele sentimento luminoso
Com o brilho que tinhas nos olhos quando eras criança
Agarra-te à convicção como se fosse uma nuvem preciosa
Só tua, guarda-a e não a deixes escapar
Faz como os postes elétricos cravados no chão
Que se agarram aos cabos, à energia que por eles flui
E jamais os largam
Deixa que seja este o teu propósito.
Não te apresses
Mastiga o tempo devagar
Define-te primeiro
Antes de mim
Antes de todos
E digere-te
Depois
Não te demores
Que o vento não espera pela ave
E os girassóis não querem saber das sombras
Não percas tempo com as sombras que a vida tem
O momento é o sol, encara-o
Sempre
De frente
E não tentes convencer-me
Que isto que digo é verdadeiro
Não acredites no que falo
Pois já nem eu acredito nos pensamentos que tenho
Nas filosofias trabalhosas e elaboradas
Que causam cãibras às sensações e adormecem os sentidos.
Não se devia poder estar vivo sem sentimentos
Nem ser filósofo, nem ser poeta.
É de uma inutilidade extrema
Quando um poeta escreve poemas de amor como este
Porque os poetas apenas devem escrever sobre temas profundos
Em verborreias racionais e lógicas sobre a realidade
E depois, cansados da lucidez de estar no mundo
Sem filtros, sem sonhos
Sem um beijo de língua, sem uns amassos num vão de escada de madrugada
Secam por dentro e sem inspiração, deixam de escrever poesia
Ficam insensíveis e tornam-se filósofos.
Acredita amor
No amor que sentes
Mas ama-te primeiro e ama-me só depois
Como eu sempre te amei
E ama, então, depois os outros
Mas, se descobrires
Meu amor
Que existem mundos
Dentro de mundos
Ficarás a entender
Que dentro de cada mundo que existe dentro de nós
Há um prato de caracóis e umas minis geladas
Há um fim da tarde, no tasco do Xico à esplanada
Onde, de mão dada, vemos juntos o benfica.